“Envelhecer é tanto um motivo para celebração como para preparação”, afirma o Dr. Bruno Medeiros, professor da rede universitária com a qual colabora a FUNIBER . Em entrevista, ele ressalta aspectos necessários para conseguir o envelhecimento ativo
A FUNIBER começa a patrocinar, a partir do dia 16 de abril, o novo Doutorado em Psicologia, titulado pela Universidad Internacional Iberoamericana de México (UNINI México). No programa, os pesquisadores poderão ampliar o conhecimento sobre metodologias para o desenvolvimento de estudos científicos com rigor e qualidade, no campo da Psicologia.
Aproveitamos para entrevistar o especialista em Psicologia Social da Saúde, Dr. Bruno Medeiros, para conhecer alguns aspectos que ainda devem ser melhorados para conseguir bem-estar na longevidade.
O dr. Bruno Medeiros é especialista em pesquisas sobre a Psicologia Social da Saúde, especialmente enfocada sobre os aspectos psicossociais do envelhecimento humano, e em outros campos como a Psicologia Comunitária.
Para obter o PhD em Psicologia pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra, ele realizou um estudo doutoral sobre as representações sociais da promoção do bem-estar psicológico na velhice. “Eu adotei uma metodologia de pesquisa que me possibilitou investigar crenças e práticas de saúde e suporte social na comunidade”; afirmou o professor Medeiros. A metodologia incluía etnografia de instituições de suporte social dos idosos, entrevistas com grupos envolvidos e o desenvolvimento de uma rede de pesquisa entre agentes comunitários.
Além das tutorias dos programas patrocinados pela FUNIBER, o doutor Bruno Medeiros participa também do Núcleo de Pesquisas “Vulnerabilidades e Promoção de Saúde”, da Universidade Federal da Paraíba, no Brasil.
Leia a entrevista com o Doutor Bruno Medeiros, a seguir:
Prezado professor, pela sua experiência investigadora no âmbito da Psicologia Social da Saúde, particularmente enfocada sobre questões relacionadas ao envelhecimento, poderia nos dizer quais são os temas mais relevantes na assistência psicológica à terceira idade?
Envelhecer é tanto um motivo para celebração como para preparação. Devemos celebrar pois avanços tecnológicos em cuidados médicos e sociais nos permitem prolongar nossa expectativa de vida. Contudo, devemos nos perguntar: “Como poderemos viver esses anos a mais?” Acredito que a psicologia pode trazer respostas e propostas relevantes para essa questão. Primeiramente, a psicologia pode ser inserida nas propostas governamentais e internacionais de promoção de qualidade de vida na velhice. Por exemplo, a Organização Mundial de Saúde tem levantado a necessidade de políticas públicas e de saúde que promovam o envelhecimento saudável, ativo e bem-sucedido. Nesse contexto, bem-estar-psicológico tem sido considerado um importante índice de desenvolvimento – mais do que renda per capita, por exemplo, em países do Reino Unido.
Em segundo lugar, as práticas de prevenção de suicídio na velhice, avaliação e intervenção de perdas cognitivas e afetivas podem ser importantes áreas de investigação e intervenção.
Em terceiro lugar, é importante destacar os aspectos positivos da velhice. Aspectos como resiliência frente às perdas da vida, sabedoria, seletividade e aprofundamento de relacionamentos podem ser melhor explorados e promovidos como facilitadores de um envelhecimento saudável.
Poderia nos indicar quais são os transtornos psicológicos mais comuns entre os idosos?
A literatura tem apontado a depressão e ansiedade como um dos maiores problemas enfrentados na velhice. Sintomas depressivos e de ansiedade na velhice têm se relacionado à percepção de um apoio social inadequado, isolamento social, perda de funções e papéis sociais e menor qualidade de relacionamentos interpessoais. Os quadros demenciais são também considerados outro problema de saúde enfrentado por milhões de idosos pelo mundo. As repercussões cognitivas e sociais dos diversos quadros demenciais demandam respostas preventivas e identificação precoce para que se viva com qualidade de vida – mesmo diante de um quadro demencial.
Desde a Psicologia Social, quais são as estratégias e metodologias mais usadas no atendimento psicossocial entre idosos?
A psicologia social pode auxiliar grupos sociais, comunidades e instituições de apoio aos idosos a melhor promoverem saúde e cuidado psicossocial. Por exemplo, em minha experiência de etnografia em centros-dia no Reino Unido, pude observar práticas e entrevistar idosos, equipe técnica, familiares e voluntários de instituições de apoio social aos idosos. A partir de minhas observações e entrevistas, eu pude discutir os resultados com a equipe profissional. Houve a identificação de áreas-problema, potencialidades e avaliação dos efeitos dos centros-dia na percepção de bem-estar psicológico dos idosos.
Minha experiência de pesquisador aponta para intervenções como: pesquisa-ação, escuta psicológica de dificuldades e potencialidades na velhice, escuta psicológica e apoio a cuidadores/ familiares, grupos focais entre idosos e familiares para melhor se entender as demandas e ações criativas de apoio psicossocial na velhice.
A pesquisa participativa constitui outra importante ferramenta para se avaliar as oportunidades, recursos e perdas provenientes do processo de envelhecimento. Através dessa metodologia, idosos são integrados à equipe de pesquisa e participam diretamente no delineamento, escolha de instrumentos de pesquisa, na realização da pesquisa de campo e na discussão de dados empíricos. Essa metodologia, além de promover maior abertura a diferentes grupos de idosos, convida os seus participantes a uma maior participação política na elaboração de práticas de cuidado aos idosos.
Considerando o crescimento da população idosa em todo o mundo, e os desafios na atenção à saúde da terceira idade, considera que a sociedade de maneira geral está preparada para um envelhecimento ativo?
Bem, essa é uma pergunta difícil. A princípio, eu diria que a sociedade de modo geral não está preparada para o envelhecimento populacional acelerado. Como disse acima, envelhecer deve ser celebrado, contudo precisamos pensar em políticas sociais mais amplas que incluam de forma satisfatória a sociedade que envelhece. O acelerado envelhecimento populacional traz desafios para a construção de políticas públicas e de saúde que atentem para as necessidades específicas de idosos em diferentes contextos. Por exemplo, o aumento de doenças crônicas não-transmissíveis (exemplo, Alzheimer) e aumento de sofrimento psíquico (depressão e transtornos de ansiedade) podem significar a necessidade de revermos as práticas coletivas de promoção de saúde psicossocial.
A boa notícia é que estamos envelhecendo! A abordagem de pesquisa e intervenção conhecida como life-span aponta para a necessidade de considerarmos o processo de envelhecimento ao longo de toda a vida. Dessa forma, o envelhecimento humano não é um processo linear ou único, muito menos um processo restrito “aos velhos”. Aspectos, biológico-genéticos, psicossociais e históricos influenciam nosso envelhecimento. Eventos de vida normativos (maturação biológica, puberdade, aposentadoria) e não-normativos (acidentes, mortes, doenças repentinas) se entrelaçam com nossa história pessoal para favorecer uma velhice saudável ou impactar nossa saúde psicossocial. Isso deve nos levar a sermos responsáveis politicamente e socialmente em relação a como envelhecemos.
Os estudos neste âmbito podem colaborar com preceitos teóricos ou práticas para a prevenção e o tratamento das condições degenerativas vinculadas ao aumento da idade? São necessárias mais pesquisas neste âmbito?
Acredito que necessitamos de pesquisas mais aprofundadas sobre o fenômeno e o funcionamento das condições degenerativas. A psicologia poderá auxiliar no diagnóstico precoce de condições cognitivas de idosos, mas precisamos investigar mais sobre intervenções psicossociais que possam nos favorecer um melhor viver, principalmente diante de quadros de debilidade cognitiva. Acredito que pesquisas devem também incluir as experiências pessoais e sociais dos idosos que sofrem condições degenerativas bem como de seus familiares e cuidadores. Há muito conhecimento a ser compartilhado através da compreensão dessas vivências diárias. Precisamos auxiliar a família e cuidadores com recursos teórico-tecnológicos para que possam cuidar dos seus amados e também manter a sua saúde mental. Pesquisas tem indicado que cuidadores familiares (a maioria mulheres) evidenciam muito estresse diante das demandas diárias de cuidado. Precisamos também saber como melhorar a qualidade de vida de cuidadores de idosos com condições degenerativas.
Poderia nos indicar quais são os mecanismos sociais usados pelos idosos mais apropriados para o cuidado da saúde?
Gostaria de mencionar dois mecanismos psicossociais que têm se relacionado a melhores condições de saúde na velhice: voluntariado e apoio social. Pesquisas apontam que idosos que se voluntariam em instituições de caridade, em cuidados familiares e em outras organizações tem vivido mais, com menor chance de depressão e melhor saúde mental. Essas pesquisas levantam importantes reflexões sobre a importância da atividade na vida adulta, especialmente na velhice. Contudo, os limites e possibilidades reais dos diversos grupos de idosos devem ser respeitados, pois nem todos conseguirão manter um nível de atividade e produtividade de grupos etários anteriores (adultos e jovens).
Em segundo lugar, o apoio social de cuidadores, outros grupos de idosos e familiares constitui um importante fator para a prevenção de problemas psicossociais e físicos em idosos. A literatura aponta para os benefícios à saúde provenientes de apoio social. Idosos que são apoiados (e que apoiam!) apresentam melhor índices de bem-estar subjetivo. Além disso, contabilidade mútua entre indivíduos de diversas faixas etárias poderá auxiliá-los no lidar com diversos problemas de saúde – além de promover um melhor relacionamento entre diferentes gerações! Essa cadeia de relacionamentos de diferentes gerações poderá promover maior inclusão social de idosos e também diminuir estigma e crenças negativas sobre a velhice e o processo de envelhecimento – nosso processo.