Um estudo publicado na JAMA Network Open analisou idosos submetidos a uma cirurgia planeada com antecedência e avaliou como diferentes categorias de índice de massa corporal (IMC) estão relacionadas com a mortalidade e complicações pós-operatórias. As conclusões questionam a ideia de que atingir um IMC «normal» é sempre o objetivo mais seguro nesta faixa etária para evitar complicações pós-operatórias e abrem a porta a recomendações mais matizadas.
O IMC e a cirurgia em idosos
O envelhecimento acarreta alterações fisiológicas que modificam a composição corporal, a distribuição da gordura e a massa muscular, além de uma maior fragilidade. Neste contexto, o IMC deixa de ser um indicador uniforme do risco cirúrgico. De facto, foi descrito o chamado «paradoxo da obesidade», segundo o qual o excesso de peso ou a obesidade ligeira podem estar associados a melhores resultados em determinados cenários clínicos, possivelmente devido a maiores reservas energéticas e nutricionais que ajudam a enfrentar o stress metabólico característico do pós-operatório. Por outro lado, quando a obesidade é acentuada, o risco de complicações respiratórias, trombóticas ou infecciosas tende a aumentar, o que sublinha a necessidade de uma avaliação individualizada.
Como foi realizado o estudo?
Trata-se de um estudo de coorte com pacientes com 65 anos ou mais atendidos em uma clínica pré-operatória de um centro académico da Califórnia entre 2019 e 2022, programados para cirurgias não cardíacas planejadas com antecedência. O IMC foi classificado em categorias padrão e foram avaliados resultados como mortalidade em 30 dias e 1 ano, delírio pós-operatório e complicações de acordo com a classificação de Clavien-Dindo. A fragilidade foi medida com o índice mFI-5. As análises incluíram regressão logística multivariável ajustada por idade, sexo, condição física e fragilidade. Como análise exploratória, identificou-se um ponto de corte do IMC em 22,5 com o índice de Youden, o que sugere que dentro da faixa «normal» podem existir perfis de risco diferentes.
Resultados relevantes
Os participantes com sobrepeso (IMC 25,0-29,9) apresentaram a menor mortalidade em 30 dias em comparação com o IMC normal (18,5-24,9), diferença que se manteve após 1 ano após o ajuste por fatores de confusão. Em contrapartida, as pessoas com baixo peso (IMC <18,5) apresentaram a maior mortalidade precoce. A obesidade leve a moderada (IMC 30,0-39,9) também se associou a menor mortalidade em comparação com o IMC normal, enquanto a obesidade mórbida (IMC ≥40) não aumentou significativamente a mortalidade, mas concentrou a maior carga de complicações, especialmente pulmonares e eventos trombóticos, e uma maior probabilidade de não retornar ao domicílio após a alta. Além disso, quase todos os eventos adversos dentro do «IMC normal» concentraram-se na subfaixa de 18,5 a 22,5, o que reforça a hipótese de que, em idosos, um IMC ligeiramente superior poderia conferir resiliência durante a recuperação cirúrgica.

Implicações finais
Esses dados sugerem prudência com as recomendações de perda de peso orientadas simplesmente para «normalizar» o IMC antes da cirurgia em idosos. Mais do que perseguir um número, convém centrar a otimização pré-operatória na melhoria do estado nutricional e funcional, detectar e abordar a fragilidade e personalizar o tratamento de acordo com o tipo de procedimento e o perfil do paciente. Ao mesmo tempo, a obesidade de alto grau continua associada a mais complicações, pelo que esta descoberta não deve ser interpretada como uma defesa da obesidade, mas sim como um convite para matizar as diretrizes e aprofundar estudos multicêntricos com estratificação por tipo de cirurgia e avaliação integral da composição corporal.
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Fonte:Body Mass Index and Postsurgical Outcomes in Older Adults