remedio“O padrão de uso de medicamentos entre idosas com mais de 60 anos é bastante influenciado pela prescrição médica, e sua qualidade é prejudicada pela baixa seletividade do mercado farmacêutico”, foi o que constatou a pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) Suely Rosenfeld, no artigo Avaliação da qualidade do uso de medicamento em idosos, publicado no volume 33 da Revista de Saúde Pública. O estudo visou avaliar a qualidade do uso de medicamentos por meio da análise do padrão do uso, do grau de concordância com a lista de medicamentos essenciais, do valor terapêutico e das interações medicamentosas encontradas entre mulheres idosas.

De acordo com Suely, no trabalho optou-se por estudar o uso de medicamentos entre idosas que participam de atividades realizadas em um centro de convivência de idosos, a Universidade Aberta da Terceira Idade da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Unati/Uerj), com acesso à assistência médica e farmacêutica regular, inscritas nos arquivos da Unati entre 1992 e 1995. “Pretendeu-se avaliar a qualidade do uso de medicamentos nessa população por meio de indicadores capazes de identificar o padrão do uso, quantificar e analisar os medicamentos, as combinações em doses fixas, as redundâncias e as interações medicamentosas consideradas impróprias”, apontou a autora.

A pesquisadora explicou que, para a realização do estudo, foram pesquisadas 634 mulheres que frequentavam a Unati. Os dados foram coletados por meio de questionários padronizados e testados. “As variáveis utilizadas foram relativas aos medicamentos e a seu modo de utilização. As unidades de análise foram o medicamento e o indivíduo”, destaca. Segundo Suely, diferentes estudos de avaliação do uso de medicamentos constataram que, além da utilização de um grande número de especialidades farmacêuticas entre os idosos, há prevalência do uso de determinados grupos de medicamentos, como: analgésicos, anti-inflamatórios e psicotrópicos.

Para a autora, assim como o número de indivíduos idosos vem aumentando, o consumo de medicamentos por essa população acompanha essa tendência. Os idosos são, possivelmente, o grupo etário mais medicalizado na sociedade, devido ao aumento de prevalência de doenças crônicas com a idade. Suely expõe ainda que “os idosos chegam a constituir 50% dos multiusuários. É comum encontrar em suas prescrições dosagens e indicações inadequadas, interações medicamentosas, associações e redundância (uso de fármacos pertencentes a uma mesma classe terapêutica) e medicamentos sem valor terapêutico”. Esses fatores podem gerar reações adversas aos medicamentos, algumas delas graves e fatais, alerta a pesquisadora.

Segundo Suely, o resultado encontrado apontou que das 634 mulheres estudadas, 9,1% não tomam qualquer tipo de medicamento. A média de medicamentos consumidos foi de 4,0 por mulher e, das 2.510 especialidades farmacêuticas citadas no estudo, há 538 princípios ativos diferentes. “Aproximadamente 26% dos medicamentos são concordantes com as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), e 17% com as da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais. Aproximadamente 17% dos medicamentos são inadequados para uso. No que diz respeito a redundâncias, 14,1% das mulheres podem sofrer consequências decorrentes desse evento. Quanto às interações medicamentosos, 15,5% das entrevistas estão expostas a principais interações”, constatou a pesquisadora.

Importância da prescrição médica na qualidade medicamentosa

O estudou revelou a importância de uma avaliação adequada no momento da prescrição, pois tais associações só tendem a aumentar a incidência de efeitos adversos. A prescrição médica é um dos fatores capazes de interferir na qualidade e na quantidade do consumo de medicamentos; o profissional de saúde responsável pela prescrição deve possuir e usar uma série de informações, como dose, custos, via de administração, efeitos adversos e eficácia, no momento de prescrever. A pesquisadora destacou ainda que “a indústria farmacêutica e seu marketing poderoso são responsáveis pela prescrição e consumo de medicamentos sem eficácia estabelecida e desvinculados da realidade nosológica da população”.

De acordo com a autora, conclui-se que como a decisão médica a respeito dos medicamentos envolve, além dos fatores supracitados, as opções de medicamentos existentes no mercado, os organismos responsáveis pela aprovação de novos medicamentos devem assegurar a oferta de produtos seguros e eficazes já no registro. “A utilização de medicamentos genéricos deveria ser levada em conta por qualquer sociedade que desejasse vivenciar uma política racional de uso de medicamentos. A população e os profissionais de saúde devem exigir das autoridades sanitárias medidas concretas, no sentido de impedir, ou ao menos diminuir, a presença no mercado de produtos perigosos para a população”, adverte Suely.

Para a pesquisadora, programas específicos de atenção ao idoso, como as universidades da terceira idade, podem ser importantes locais para realização de programas assistenciais, de educação continuada e de pesquisas, e também centros de referência de estudos e formação de recursos humanos. “Atividades educativas, tanto para os profissionais quanto para os alunos, podem ser realizadas buscando-se o aprimoramento do uso de fármacos pelos idosos. Tais informações poderiam ser transmitidas por meio de vídeos, palestras e cursos, com ênfase especial no papel que o farmacêutico pode desempenhar como educador”, destacou Suely.

Fonte: Saúde e Movimento