Há uma série de livros no mercado editorial sobre liderança. Muitos apresentam receitas, passo-a-passo, além de uma atestada estruturação de empresas. O que muito desses manuais não levam em conta – ou levam de forma dissimulada – é que parte do que garante a liderança é justamente uma vontade de não liderar.

Sejamos mais claros: parte da liderança consiste em atribuir responsabilidade nos outros, em contar com os outros, deixa-los livres dentro daquilo que se propuseram fazer no seu ambiente de trabalho. Em outras palavras, liderar é abrir, não é fechar. Muitas vezes se confunde um líder com aquele que fecha num objetivo, num foco, numa meta. Isso de fato foi verdade, pois é constante a carência da maioria das pessoas por alguém capaz de apontar um caminho, iluminar uma trajetória. Porém o mundo é outro.

As novas gerações têm muitas dificuldades em seguir hierarquias, de ordens de cima pra baixo. A negociação e o jogo cada vez se tornam mais presentes nas relações humanas – e de forma assumida. Há um teatro consciente em que todos participam. Como liderar se todos são apenas personagens de importância igual à sua na peça? Uma sugestão: pelo próprio teatro, pelo jogo mesmo.

A diferença entre o jogo e as relações hierárquicas de cima à baixo é que no primeiro as posições são provisórias, mutáveis, dependentes do amplo acordo de todos, enquanto que no segundo se estabelece um sistema fechado de posições fixas que só podem ser alteradas dentro das próprias regras do sistema. O líder do jogo portanto é o maior dos jogadores. E o que isso significa isso?

Significa que o líder é aquele que consegue propor maneiras de se jogar que pareçam a mais interessante pra todos, não controlando as atividades dos liderados, nem mesmo os tratando como liderados. O líder do jogo não acumula responsabilidades, ele as divide. Com isso todos se sentem responsáveis para que o jogo tenha prosseguimento.

Talvez se advogue que ainda assim estamos falando de controle, de uma forma mais requinta de manipulação invisível. Porém há de se levar em conta que no jogo a posição de todos é amplamente conhecida e que o controle acaba mais por aparecer na medida de si mesmo, na escala de auto-controle. Já o líder é o rei do auto-controle, é ele quem sabe como jogar da maneira mais talentosa visando o melhor do projeto a ser desenvolvido. É o líder quem sabe com precisão o que ele deve fazer, e qual é o papel mais interessante que os liderados podem executar no jogo. Porém o líder deve propor de forma competente, deve expor de forma sincera e nunca impor autocraticamente.

Liderança é acima de tudo confiança. A confiança que alguém tem em você para que você seja capaz de dividir e, quando preciso, amparar as responsabilidades alheias. Eis o grande desafio do líder porvir: alguém que consiga unir pessoas num jogo que lhes seja igualmente proveitoso num determinado momento, mas de forma não impositiva, não controladora, não furtadora das responsabilidades dos outros através da sua posição de comando opressor.

Cada um deve saber de si e o líder, no final das contas, é quem sabe isso melhor.

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Escrito por Alexandre Linck, diretor de cinema