Em cada período da história da humanidade houveram temas que dominaram os pensamentos em torno da economia e das políticas globais. No século XIX predominada uma política generalizada de propagação da indústria à qual se juntou, logo da primeira metade do século XX, duas guerras mundiais e depressão econômica. Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo, por quase cinquenta anos, conviveu com a angústia da Guerra Fria. No século XXI, dentre os vários conflitos políticos e econômico, emergue um novo e esperançoso tema: o da sociedade sustentável.
Novos séculos trazem mudanças gerais de pensamentos, transformações, mudanças de comportamento e tendências por vezes imprevisíveis, imperceptíveis em abrangência e profundidade, afinal, é difícil perceber isso quando não olhamos retrospectivamente, quando estamos vivendo estas transformações. Mas vemos a necessidade de uma completa reestruturação nos atuais modelos globais de economia, vemos o tempo afirmar urgência em soluções e mudanças sociais, que ocorrem naturalmente, via de regra, mas de forma lenta e por etapas, pois é preciso superar a inércia tanto da população como das instituições, geralmente resistentes a mudanças.
A bióloga americana Rachel Carson publicou A primavera silenciosa em 1962, e somente 36 anos depois, seu alerta ambiental fez efeito e provocou o movimento ambientalista moderno. A indústria tabagista americana levou 34 anos para fazer acordos com os governos estaduais no que se refere aos danos que o cigarro causa à saúde. Na Europa oriental, levou-se quarenta anos para a revolução política que derrubou o socialismo, com a queda do muro de Berlim em 1990.
Já a entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial, que se arrastava em intensos debates internos entre os anos de 1940 e 1941 e tinha a maioria da população contrária à essa entrada, após o ataque japonês a Pearl Harbor, em setembro de 1941, desencadeou uma grande mobilização nacional diante da ameaça à soberania dos EUA e o país rapidamente respondeu ao ataque japonês e entrou na guerra.
Há de se construir um novo paradigma, fundamentado não só na racionalidade ambiental, mas também em formas mais éticas de estímulo à sobrevivência da humanidade e à coexistência pacífica. Todos devem ter oportunidades de participar e construir uma sociedade mais solidária e justa, que produza bem-estar e qualidade de vida aos seus membros.
Esse processo de mudança pressupõe a melhoria das condições sociais e econômicas, sem comprometimento das condições ambientais e dos recursos naturais. Prega a preservação do capital natural por meio de profundas alterações não só nas formas de produção, mas também na modificação do perfil do que se produz, em consonância com rígidos padrões de consumo. A sociedade busca submeter-se aos preceitos da prudência ecológica, ao fazer bom uso da natureza em prol do bem estar das atuais e futuras gerações, em uma dimensão de visão de longo prazo.
Verifica-se, nas organizações empresariais, nos governos e na sociedade civil, a construção desse novo paradigma: quem pretende ter longevidade na era global de competição acirrada em curso deve não só se importar com as atividades econômicas, mas também e principalmente com suas ações nas áreas sociais e ambientais, tendo como foco o desenvolvimento sustentável.
O atual modelo insustentável de consumo favoreceu a concentração de renda e poder e criou a sociedade da afluência. Passados mais de duzentos anos da Revolução Francesa, somente um pequeno número de nações produziu sociedades igualitárias, livres, abertas, pluralistas e conseguiu altos indicadores de Índice de Desenvolvimento Humano – IDH.
A maior parte dos países do mundo é caracterizada por sociedades desiguais, com altos índices de exclusão, polarização e desemprego, em que a pobreza é uma constante ameaça à prosperidade. Os constantes e progressivos processos de degradação entrópica e antrópica desfiguram o finito planeta, privilegiando uns em detrimento de outros.
Uma sociedade sustentável é aquela que se organiza e se comporta de forma autônoma e democrática, em busca de um futuro comum que possa garantir, a partir de sua cultura e seu desenvolvimento histórico, qualidade de vida e bem-estar aos cidadãos e ecossistemas em que está inserida, sem diminuir as possibilidades de usufruto das futuras gerações.
Para se construir a sociedade sustentável, faz-se necessário definir propósitos comuns, nos quais as regras da direção certa de ações individuais ou coletivas, de qualquer nível, são fundamentadas na ética, na justiça e na equidade. Quem constrói essa sociedade são as pequenas ações de cada cidadão, refletidas em movimentos populares, conduzidos por líderes visionários.
À medida que uma sociedade se funda sobre a igualdade social, econômica e política e sobre recursos renováveis e recicláveis, mais sustentabilidade produz. Em certa medida, ela pode até utilizar fontes não renováveis, mas, se o fizer, que seja de maneira racional sem prejudicar as futuras gerações. Dessa forma, para ser sustentável, qualquer empreendimento humano deve ser ecologicamente correto, economicamente viável, socialmente justo e culturalmente aceito.
A natureza opõe uma recusa inegociável ao frenesi da lógica capitalista global e cobra o desenvolvimento sustentável, composto pelo tripé: desenvolvimento econômico, social e ambiental. Esse tripé deve ser a base e a direção a ser seguida nas atividades públicas e privadas em busca de uma sociedade sustentável.
Um exemplo claro de sociedade sustentável é o estilo de vida indígena, que se baseia unicamente em fontes renováveis de energia, fundamentalmente a fotossíntese. Essas comunidades não utilizam combustíveis fósseis, e a lenha é empregada de maneira sustentável. Não ocorre destruição visível do meio ambiente, pois se adaptam a ele. Vivem de maneira idílica para o sustento do grupo, altamente estruturado por meio da fartura de frutos, caça e pesca. Moram em habitações toscas de palha e madeira que ficam expostas ao tempo. Não têm ideia de propriedade nem desejos de distinções e vaidades sociais.
A comunidade indígena possui um paradigma frugal de viver, com ritmos baixos de atividades, produção, consumo e estresse ambiental. Controla a derrubada de árvores, o fogo das queimadas, a construção de casas, o processo de preparo diário de alimentos e, quando percebe sinais de estresse ambiental, muda-se. A forma de conhecimento depende da experiência, transmitida oralmente através da tradição, por séculos a fio. O homem civilizado, ao se aproximar da sustentável civilização indígena, tornou extenuante sua sobrevivência.
Em contrapartida à civilização indígena, nunca antes na história da humanidade tantos viveram com tanta fartura, longevidade, conforto e inúmeras e modernas opções de consumo. A sociedade americana é o exemplo mais claro e representativo de uma sociedade insustentável, da economia do descarte, que cresce e se desenvolve com altíssimos padrões de consumo, desperdício exagerado e pouca preocupação com a preservação dos recursos naturais e do meio ambiente. Entretanto, os afortunados desse modelo de desenvolvimento são minoria e, segundo dados do PNUD, 4 bilhões de pessoas ainda vivem com menos de US$ 1 por dia.
Fazer que toda a humanidade tenha um padrão de vida digno, com acesso a alimentação adequada, saúde, educação e oportunidades de trabalho, é um enorme desafio, mas possível de realizar-se. Há recursos financeiros, tecnológicos e meios de produção para elevar o nível de vida de grande parte da população, como jamais ocorreu na história, apesar do quadro de insustentabilidade que vem sendo construído pelo ser humano desde a Revolução Industrial.
Mudanças de postura, hábitos e paradigmas podem auxiliar na construção da sociedade sustentável, mas mudar formas de viver já arraigadas há tempos é um processo deveras complexo, moroso e que depende fundamentalmente de vontade política. Para alcançar o desenvolvimento sustentável, devem-se vencer três grandes desafios, interconectados: garantir a disponibilidade de recursos naturais; não ultrapassar os limites da biosfera, para assimilar resíduos e poluição; e reduzir a pobreza no mundo.
Ter-se uma sociedade sustentável requer, portanto, uma dramática e dolorosa transição na utilização de energia, água, terra e minerais, à medida que esses recursos diminuem em quantidade, declinam em qualidade e aumentam em custo. A população terrestre continuará a crescer pelo menos durante mais um século, ao mesmo tempo em que os enormes desperdícios deverão ser reduzidos e as pessoas deverão ser mais eficientes e conscientes na conservação do capital natural, na redistribuição de renda e riqueza e no planejamento familiar. Obter o equilíbrio no desenvolvimento de nações e ter ao mesmo tempo a sabedoria para reduzir desigualdades sem privilégios torna-se o grande desafio na construção da sociedade do futuro, a sociedade sustentável.